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Caminho de Santiago da Geira e dos Arrieiros (4ª Etapa Lóbios-Castro Laboreiro)

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Author

Trail stats

Distance
12.92 mi
Elevation gain
2,365 ft
Technical difficulty
Moderate
Elevation loss
1,102 ft
Max elevation
3,137 ft
TrailRank 
53
Min elevation
1,156 ft
Trail type
One Way
Moving time
5 hours 7 minutes
Time
7 hours 10 minutes
Coordinates
3514
Uploaded
May 18, 2023
Recorded
May 2023
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near Gález, Galicia (España)

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Itinerary description

Por via de um demorado pequeno almoço meia hora de atraso já levamos e mais que dez passos não demos ainda. Despertou a aurora e nós vimo-la vestir-se. É lindo. Timidamente despiu o véu escuro pontilhado de lantejoulas e, já desnuda, envolveu-se numa diáfana cortina translúcida. Adivinhámos as formas sem que se nos fossem revelados os pormenores. Os pontinhos celestiais luminescentes foram perdendo o brilho até se apagarem. Um manto dourado emergiu então como áurea invertida subindo até tudo cobrir e, por fim, vestiu-se irradiante de luz mostrando toda a formosura.
A frescura matinal acelera-nos o passo. Passámos por silenciosos e dormentes espigueiros. Alguns, já agonizantes, esperam que alguém se lembre de os restituir à vida. Outros envelhecidos por anos e anos de serviço, esquecidos e abandonados física e funcionalmente, questionam as novas gerações se razões há para de pé continuar. Nunca tão fotografados foram mas para quê, se instangram ou facebook o que são não sabem e, por isso, vaidade lhes não trazem?... deixá-lo!... memória restará disseminada persistentemente. Um dia alguém dirá “meu tetratrisavô usava estas prismáticas estruturas para armazenar e secar grãos colhidos de ervas que, depois de moídos e reduzidos a pó, se misturavam com monóxido de hidrogénio para fabricar umas esferas que levavam ao forno a cozer e lhes servia de comida".
Perdoe-se a este pobre peregrino os devaneios matinais. Elevo o olhar na demanda do perdão celestial mas ficam meus olhos presos na torre da igreja de San Miguel que se perfila contra um céu pleno de cambiantes que o sol ainda escondido vai pintando. Seguimos o Camiño dos Zapateros sorvendo a pureza do ar matinal com cheiro a terra e erva fresca. Passamos os “hórreos de Fondevila" e as casas de pedra da aldeia. Algumas cuidadosamente recuperadas, outras ansiosamente à espera de o ser e outras tristes por o ter sido.
Os “romanos” que povoaram as memórias até aqui, abandonam-nas agora. A Via Nova seguiria para Aquis Querquennis e por diante até chegar a Asturica Augusta. Nós seguimos para os montes do Laboreiro e haveremos de chegar a Santiago.
Outros personagens hão de os romanos substituir ou então talvez nos dediquemos a aspetos transcendentais e/ou metafísicos senão espirituais. Brinco, claro!
 “Desligo” agora o gravador de memórias e… não, não ligo à terra… converso com a companheira que há mais de quarenta anos acompanha o meu caminhar. Estes diálogos tão íntimos gravam-se no íntimo e têm lugar diferenciado na memória deste peregrino. Porque os não transcrevo?... porque não!... Mas se algo houver que digamos e eu achar que é interessante para o conhecimento deste caminho ou do que ele pode suscitar a um peregrino, sim, transcrevê-lo-ei.
O silêncio cala-nos. Fico um pouco para trás e o pensamento emudece e mudo sigo usufruindo a frescura matinal que, nos campos, se reflete em orvalhadas gotículas, tão minúsculas que a desaparecer não tardarão.
Acordo de mim junto da ponte que atravessa o rio que nasce Límia no monte Talariño, que ali abaixo terá dois nomes: Límia na margem direita e Lima na esquerda, mas que depois Lima será e banhará uma das mais belas cidades de Portugal. A Viana houvéramos de ir para ver quão belo se espraia antes de ao mar chegar. A beleza das margens e a languidez das águas inquietam o meu espírito: será este o mitológico Lethes ou “Oblivionis flumen” que os soldados de Decimus Iunus Brutus Callaicus se recusaram atravessar?... de tão belas margens e calmas águas, a ocidente de Roma localizado, só poderá ser este o rio do perpétuo esquecimento. Receoso mas esperançado por nas águas não tocar, atravesso a ponte continuando a repetir o meu nome e o dos que mais queridos são… … …
Fora o Lethes este Lima que em meus olhos se refletiu e teria, para alívio de muitos, a escrita desta crónica finado acima.
Bem… bem mal! vamos por um caminho que o certo não me parece. A imagem satélite do GPS deixa-me sérias dúvidas. Efeito do Lethes?... Voltamos à OU-540, andamos mais 20 metros para a frente e… ali está a sinalização do caminho. Passa mesmo pelo espaço das bombas de gasolina e vamos já a subir, pinhal acima, por um caminho que atrás delas existe.
Esqueci o que depois de passar as “gasolineras" aconteceu e desperto aqui junto desta ermida onde os santos ainda não acordaram e esperam que o padeiro deixe os pães na saca que pendurada está na grade da porta. Pelo que me é dado saber trata-se da “capilla das Quintáns" e mais não sei. Desejo bom apetite aos santos desconhecidos que aqui se veneram e seguimos. Feira Vella é já aqui mas ainda não acordou. Recomendamos aos bastões ssschiu e nós vamos pousando as botas com jeitinho para não acordar ninguém… vrrum vrrum vrrum… o velho trator que custa a pegar transforma o nosso cuidado em algo sem sentido. Sentidos opostos: nós para cima e ele para baixo.
Ali, um bonito e orgulhoso espigueiro exibe a sua beleza recém recuperada. Agora um outro esventrado e despelado deixa, generoso e humilde, que o sol através dele passe alegrando a câmara do telemóvel e o nosso olhar.
Deixamos o asfalto, que há muito vimos pisando, para atalhar por um bonito bosque entre carvalhos e castanheiros. Passamos uma velha ponte de pedra com guardas frágeis, chumbadas e improvisadas. Que terá acontecido às originais?...ou será que nunca as teve. A límpida água corre na ribeira refletindo fetos reais, jovens choupos e velhos freixos, acariciando as pedras que lhe definem o leito.
Termina o atalho e, para evitar o perigo da OU-1212, somos desviados por mais longa mas menos perigosa rua de O Casal. Pronto, voltamos à estrada evitada enquanto pôde ser. A dureza do asfalto silencia-nos. Por Entrimo adentro vamos entrando. Lá em cima, em Terrachán, avistamos já a igrexa de Santa María la Real. Nada mais olhamos porque ansiávamos por conhecer esta jóia do Barroco “Churrigueresco". Em anteriores “camiños" outros monumentos encontrámos em que o “churrigueresco" estava presente ou na totalidade eram tidos como tal. E, (de outro modo não podia ser) a curiosidade levou-me a procurar as  origens deste estilo que no nosso cantinho não é comum encontrar-se.
Recordo: 1º, fiquei a saber que tão estranho nome é o de uma família de escultores de Salamanca; 2º, é utilizado em Espanha para adjetivar a escultura, arquitetura ou decoração mais extravagante ligada ao barroco e rococó; 3º, é principalmente encontrado em retábulos do final do séc. XVII à primeira metade do século XVIII.
E cá estamos junto desta espetacular “abadia”. A conclusão deste templo “estima-se” ter acontecido no ano de 1739. Quedo-me atónito, triste e irritado porque o acesso é-nos vedado e aproximar-nos não podemos. Procuro um ângulo que me possibilite tirar uma foto do magnífico portal que se assemelha a um retábulo barroco com colunas salomónicas e uma profusão decorativa magnificente. Não consigo nada de jeito. O que li sobre este templo não me é permitido ver de perto. Regressarei?... talvez. Desconsolado penso, para minha consolação, que, na arte que decora este portal, alguns autores de cá põem a hipótese de ter havido mão de escultores portugueses a colaborar para a esta grandiosidade ou, no mínimo, nela ter havido influências lusas. O que os leva tal sugerir são pormenores que a mim estão vedados por estar longe, não da arte mas do conhecimento dela. Fala um texto que li num “escultor portugués" Alonso Martinez Montánchez (nome bem português não é?...) nascido em Chaves, falecido em Ourense no ano de 1615. De 1615 a 1739, parece-me que são demasiados anos para que não duvide. No entanto ficou-me a curiosidade de saber quem era este “escultor “orensano” nascido em Chaves”. Tudo o que encontrei foi em documentos galegos e parece que entre 1594, quando terá chegado a Ourense, e o ano da sua morte este “portugués" tem obra de imenso valor. Sinto-me orgulhoso!
Vou de volta, sempre afastado pelo muro que delimita o espaço, e olho para a torre. Ainda que barroca é de grande simplicidade de pormenores. Aqui não houve mão portuguesa. Desisto e volto ao caminho.
Sigo no encalço da minha companheira perseguido por um triste sentimento de impotência, de inclemência ou adversidade, no momento e circunstâncias, que mudar não posso. Em vão tento sossegar-me justificando a falta de oportunidade com a diferente finalidade que move um peregrino. Terei oportunidade de ver o que hoje não vi?... talvez! (que tímido e duvidoso foi o advérbio). Penso no Alonso português e no que tantos portugueses foram fazendo pelo mundo deixando a marca “made by" que continuam por cá ignorados. Vou, cada vez mais,  encontrando-me com a portugalidade que me vai na alma.
Já juntos vamos, falando destas e outras adversidades que connosco vão tropeçando, das coisas boas que encontrando vamos e do prazer que nos vão dando. Comparamos este com outros caminhos e antecipamos o que podemos vir a encontrar. Depois os filhos, que diariamente não se esquecem de ligar, são motivo de conversa. Caminhamos por aqui e por memórias. Confrontamo-nos com dificuldades e sucessos. Lembramo-nos de Deus para que Deus não nos esqueça.
Começamos a sentir a dureza do asfalto quando, à saída de uma povoação, talvez Eiroás talvez Ferreiros de Abaixo, à nossa frente aparece uma belíssima roseira que exala uma fragrância suave que perfuma o nosso humor e alegra o espírito. Logo aqui, um rebanho de ovelhas esquece o pasto e, num gesto unânime, viram-se para nós com um misto de curiosidade e dó no olhar. Pobres de nós que até às ovelhas inspiramos pena. Lá se foi o efeito do perfume das rosas no estado de espírito destes pobres caminheiros.
Descemos a Ladeira do Folón e, por calçada semelhante às que os romanos construíram, atravessamos a ponte, de medievo aspeto, sobre o Río Agro. Subimos agora a Ladeira do Cernadelo continuando a escolher as lages onde pousar os pés. A subida é longa e íngreme e na parte mais inclinada, porque lavada por muitas águas, a calçada é rarefeita e obriga a atenção redobrada. Melhor será seguir calado e mais atento.
Quase há 4 quilómetros que vimos subindo por caminho ora calcetado ora sulcado. Valeu-nos a generosidade dos bosques que nos têm sombreado. Aplanou em A Granxa. Entre muros caminhamos quando a minha companheira pára assustada. O motivo está ali. Enroladinha, gozando as delícias de um sol estival na primavera, uma cobra de considerável tamanho (mais de metro e meio). Corre uma e zaguezagueia a outra, ambas assustadas e na mesma direção. Eu assisto de bancada esquecendo que tenho uma câmara na mão. A cobra mete-se num buraco do muro de pedra, a Alice depressa recupera do susto e o acontecido é agora motivo de conversa animada.
Estamos a entrar em A Pereira. O pasto verde rouba na veiga o que ao milho e ao centeio pertenceu. O caminho entre muros está enlameado, pisoteado e pleno de bosta. Vamos inventando onde pôr os pés com a certeza de que limpas daqui não sairão as botas. Os "canastros" abandonados e de triste aspeto mostram saudade de tempos que o tempo levou. Agora é tempo de gado e necessárias são as pastagens e os estábulos.
Batendo as botas, entramos na aldeia. Uma tábua apoiada em duas pedras tenta a nossa vontade de descansar. Aproveitamos antes os degraus de velho granito duma casa desabitada e pousamos as mochilas. Tiramos a bucha e preparamo-nos para comer. Um pequeno cão, rafeiro de aspeto, aproxima-se e ensaia uma ladradela não muito convicta. Chamo-o pressupondo que me entende tão bem quanto ao dono que lhe diz «Rás, tranquilo!» e para nós «el non morde» de novo para o cão «Rás, vem aquí!..» mas o cão sentou-se junto de nós e aqui está à espera que partilhemos com ele os “bocadillos de xamón" que trouxemos do Lusitano. O dono pede desculpa, chama insistentemente o cão mas em vão. Vamos lá, toma. O Rás abocanhou o bocado de pão com presunto, lambe a boca e fica à espera de mais. Acabámos. O Rás finalmente obedece ao dono e segue atrás dele. As mochilas com pouca vontade sobem para as costas. Se mais leves estão não se nota.
Vem ali uma senhora. O peso da vida curvou-lhe as costas. O cajado que outrora guiava o gado suporta a carga que os cansados e flácidos músculos já não conseguem.
—Bom dia— dizemos.
—Bom día— nos responde e continua — san portugueses?... adonde van?...
—A Santiago.
— Hai unha fonte por diante.  Podes beber a auga que é moi boa.  Cando non tiñamos auga canalizada, todos iamos alí buscar auga para as nosas casas.  Levabamos cántaros na cabeza.
Agradecemos, saudamos e partimos. A fonte está logo ali junto do Forno Comunitário. Enchemos a garrafa vazia. Lemos o painel informativo da Ruta do Pan que está entre o lavadouro e o tanque onde bebiam os animais (não sei se ainda bebem). Informa quem passa que na casa de pedra existe ainda o “forno comunitário”. “Que Deus te aumente com San Vicente, que Deus te levede com San Mamede" se orava depois da farinha amassada. Enquanto o pão cozia as famílias juntavam-se à volta do forno contando estórias, cantando cantigas e salmos. E o pão crescia e aloirava e, imagino, exalava um cheirinho que pedia manteiga e… bolas, só de imaginar já as papilas começam a salivar.
Paro junto ao cruzeiro. Está plantado no meio de um pequeno e circular tanque cheio de água que lhe serve de base e onde os animais bebem e abençoados são por esta cruz. Lá ao fundo está a igreja de San Facundo. Hesito entre ir até lá ou seguir a minha companheira que, uma vez mais, para aqui me deixou só e desamparado. Olho para a igreja indeciso. Estou numa de “vou?...não vou" quando uma senhora idosa, a meia distância entre mim e a igreja, sai de casa e começa a chutar os montes de bosta fresca que povoam a rua mesmo defronte da porta por onde acaba de sair. Os excrementos, ainda húmidos voam, espalham-se na rua, colam-se no muro em frente e a senhora de pau em riste vocifera algo que não entendo. Testemunha única deste singular e caricato episódio em terra de poucos vivos, opto por dar meia volta e seguir caminho, como se nada tivesse visto.
Entre muros saímos da aldeia. Já o Mioto se vê e aqui ao lado pasta uma manada, quiçá a que borrou a rua à porta da tal senhora que, lá atrás ainda deve andar aos chutos na bosta fresca e vociferando raios e coriscos.
Mioto é o outro nome do milhafre, aquela ave de rapina que come os pintos quando a dona da galinha se descuida. As vezes que por aqui pairava por certo azo deu a que este outeiro de Mioto se batizasse. Entre um lajeado de grandes pedras e para lá dele as giestas pintam a paisagem de um  amarelo doirado tão belo que digno seria da paleta de Van Gogh. Continuamos entre muros de pedra solta com um carvalhal a emoldurar a paisagem e as “maias" doirando o belíssimo quadro que meus olhos enche e o espírito alegra.
O Mioto para trás ficou sem que um mioto tivéssemos visto. As pedras dos muros envelheceram e, de musgo enfeitadas, embelezam, ladeando, um caminho de lajeado carcomido pelo tempo que nos obriga a manter os olhos no chão. Já duvido que não sejam romanas estas calçadas. Denotam um envelhecimento de aspeto milenar e um desenho parecido aos que encontrei nas calçadas romanas que já calcorreei. A minha “bíblia" das vias romanas nenhuma assinala que por aqui passe. Mas que “eles” andaram por aí, andaram.

O chão aplanou e o mesmo sucedeu ao caminho. A Gurita é o nome que o povo deu ao lugar por onde passamos. São terrenos de pastagem. Uma manada pasta mansamente ao lado do caminho mas uma vaca de considerável porte decidiu atravessar-se onde nós temos de passar. Eu ainda estou longe. A Alice já perto pára e diz: — eu não passo! — quando me aproximo, pachorrentamente, a vaca sai do caminho mas, ali à beira, fica a olhar-nos ainda não  convencida que deixar-nos passar tivesse sido boa ideia. Eu olho-a com curiosidade. Não percebo muito de raças autóctones, sei, todavia, que aqui deveria encontrar já a Cachena, mas nada estas vacas grandes têm que se pareça com as nanicas cachenas. Os corno pequenos e quase retos destas nada se parecem à grande armação em forma de lira helicoidal que enfeita as outras. Atrevo-me a estender a mão e faço-lhe uma carícia, bem aceite, no focinho. Vou-me embora e a vaca volta a ocupar lugar no caminho que é seu.
O caminho longo à nossa frente, o silêncio, o céu que olho de um azul suave, as montanhas que nos rodeiam, tudo… tudo nos convida à meditação. Nada se ouve… nem o vento bule… somos nós, a serra e o céu. Meditamos. Canta nossa alma um salmo de gratidão:
“Os céus declaram a glória de Deus;
o firmamento proclama a obra das suas mãos.” (Salmos 19.1)
Olhamos à volta contemplativos.  Caminhamos num plano a quase 800 m de altitude rodeados por montanhas mais altas ainda. À direita o Candeiral e Outeiro do Castelo limitam-nos o horizonte para dentro da Galiza. À esquerda a Costa do Mareco inclina a Peneda para a inverneira onde corre o Rio Laboreiro.
Olha!... lá em baixo!…
Entre nós e o rio passa vagarosamente uma manada de garranos selvagens. A paisagem ganha vida e fica mais bela ainda. Seguimo-los com os olhos até que desaparecem por detrás de um outeiro.
Voltamos ao caminho mas mais revigorados. O mato rasteiro onde campeia a urze e o tojo, uma de flor lilás outro de flor amarela, é território de caça da raposa e, por aqui, naturalmente, se chamam estes sítios de Raposeiras. Há tanto tempo que os meus olhos não contemplam tão bonito animal. Olho à volta esperançoso, mas nada. Entretenho-me então a observar os montes de megalitos erráticos que povoam os outeiros e cabeços à nossa direita. Aqueles pedregulhos equilibrando-se uns sobre os outros, recortando-se escuros no claro azul do céu, suscitam cenas fantásticas dignas de Tolkien ou R. R. Martin. Já desce do cabeço, por imaginário trilho, a Peeira liderando a alcateia em direção a estes aventureiros mortais que ousaram invadir os seus domínios e… e o sol na moleirinha faz destas coisas.
Acabamos de deixar o estradão e entrar num aprazível bosque de carvalhos e logo aqui está o marco que limita a fronteira. Aqui se abraçam de novo Portugal e Espanha. Ameijoeira é uma Inverneira das muitas que povoam o parque Peneda-Gerês. Não subimos à aldeia mas passamos junto à capela do Senhor da Boa Morte. Todas as pessoas que vivem ali caberão na galilé que se estende em frente à vetusta capela e decerto poucos saberão porque tem este orago, no entanto lá para setembro farão aqui uma grande festança.
Por detrás da capela seguimos por caminho que conta histórias. Aqui, as pedras que foram paredes de uma  casa jazem amontoadas à sombra dos velhos carvalhos que, provavelmente, as viram erguer com amor, muita esperança e desejos infindos de felicidade. Quanta partilha de afetos aqui aconteceu?... quantos projetos?... quantas ilusões?... Tudo perecível.  O único sentido que a vida tem leva-nos, nunca nos traz. Só a memória nos traz o tempo passado, mas até ela é perecível… e no fim?... a morte. Terá o Senhor da Boa Morte se compadecido de quem aqui habitou, sofreu e amou?... terá sido Boa a passagem para além da Morte?... Não é muito satisfatória a minha parenética, pois não?... só eu me ouço. Desisto.
Vamos juntos, falando de inverneiras, brandas, desertificação, emigração e vida dura. Vamos juntos, falando de serra, penedos, carvalhos e da beleza que deliciados juntos vamos gozando. Juntos vamos falando do que passámos e do que esperamos que venha… juntos calamo-nos agora porque o caminho é sobre rocha e uma escorregadela pode magoar a sério. Os trilhos de um e outro lado afundaram onde as rodas das carroças ou carros de bois repetidamente passaram.
Entramos por uma carvalheira dentro e começamos a ver os reflexos azuis da água à nossa frente. É o Poço do Contador. Recanto de sonho. Recanto de beleza. Recanto recatado de sossego e sonho. Esperem!... não posso esgotar aqui os adjetivos porque depois como adjetivo tantos outros lugares de grande beleza que decerto iremos encontrar?... toda a gente que fala deste lago fala dos banhos nesta água de cristal, mas para isso tempo não há. Seguimos.
Passamos uma pontelha de aspeto celta, possivelmente não o será, faltam-lhe as asnas em “V” invertido, não sei, mas estas grandes lages de granito do tabuleiro lembram-me outras que conheço e o são. As águas que por baixo correm são as da Ribeira da Curveira que alimentavam o Moinho de Bago de Baixo, peça de museu ao ar livre que “o curador" descurou. As paredes seguras quase intactas e ausência de ferrolho e porta que o tivesse, leva a que arrede as silvas e entre. – tem cuidado – ouço e obedeço. Lá dentro restam as mós mas, mesmo essas, “na mó de baixo". O que me vai na alma!... o meu lamento só o ouvem estas pedras que outros lamentos mas desesperantes que o meu ouviram. Comunitário foi o moinho e perdeu decerto a conta aos moios de centeio e milho que moeu. Agora deixo-o com o silêncio e sorte a que foi condenado.
Depois de um carreirito adornado de erva e enfeitado e perfumado por giestas floridas, atravessamos agora o Laboreiro prá outra margem. Deixámos a terra dos “camarros" e entramos na dos “gorriões". Estórias de discórdia que, mais que o rio, desuniram os povos mas, diz-se, que o amor de dois jovens voltou a unir. A pontelha que nos leva é em tudo semelhante à que pouco há atravessámos só que mais comprida esta, diferenciando o que um rio é relativo a uma ribeira. A água transparente e de suave deslizar reflete os vidoeiros que as margens embelezam.
Como usa dizer-se: não há duas sem três. E aqui está a terceira pontelha. Esta onde passamos agora atravessa o Ribeiro da Dorna numa zona muito linda. A ancestralidade destes caminhos gera em mim um sentimento que definir não sei. É assim uma espécie de angústia misturada com saudade, cozinhadas em um misto de impotência, dor e revolta. Neste caldo há gente a povoar o meu pensar. Gente que por necessidade, obra fez e que, por necessidade a usou; gente que não teve subsídios para a construir e tempo não perdeu em lamúrias e protestos; gente que construiu a vida sem que nada devesse a alguém; gente simples que tudo o que tinha se lhe devia; gente para quem a rudeza da serra era a vida e outra não conhecia; gente perdida na montanha para quem da montanha nada entendia; gente que… pura?... não existe mais.
Neste caminho, por onde subimos, protegidos da inclemência do sol pelas frondosas copas dos carvalhos, paro e olho a aldeia de Bago de Baixo. Quantos habitantes terá?... vou-me habituando às respostas que não tenho. Olhando o solo avançamos serra acima. O caminho é de calçada como outros por onde passámos. Há árvores caídas e escoadas mal cuidadas. Quando a água por aqui escorrer danificará mais este ancestral caminho. Que bonito é… por enquanto.
Lá em baixo corre o rio Laboreiro. O cantar da água, por pouca que é, não se escuta aqui de cima. Já se vê a Ponte da Cavada Velha. Ponte romana intervencionada na baixa idade média. Para relembrar pormenores, porque já cá tinha estado, consultei o site monumentos.gov.pt pois tinha conhecimento que tinha sido considerada monumento nacional por DL de 1983. Neste site, e em muitos outros, chamam-lhe “Ponte da Cava da Velha". Parece, todavia, que se trata de um erro cometido pelo redator do decreto ou de quem lhe forneceu a informação. A ponte está na Cavada Velha, por isso naturalmente se deva chamar “Ponte da Cavada Velha". Mas quem sou eu para querer corrigir o SIPA (Sistema de Informação para o Património Arquitetónico)?... tenho a certeza que nada se alterará só porque manifesto aqui a minha opinião. Vi agora, não estou só: consulte-se “Lapsus Calami" em http://www.monteslaboreiro.com/castrolaboreirolapsuscalami.html vale a pena andar com a internet no bolso. A ponte é um impressionante testemunho do passado mas não sei é até quando no futuro. O “caminho” não atravessa a ponte. Que via romana a atravessaria?... decerto que tentar saber eu irei. Terá existido uma derivação da Via Nova que começaria por altura da Retorta (Lóbios), m.p. XLV a Braga, dirigindo-se ao maior acampamento romano da península, o Castrum da Lomba do Mouro,

Waypoints

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Photo ofHórreos à saída de Lóbios Photo ofHórreos à saída de Lóbios Photo ofHórreos à saída de Lóbios

Hórreos à saída de Lóbios

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Photo ofA madrugada despontando por detrás da torre da igreja de San Miguel Photo ofA madrugada despontando por detrás da torre da igreja de San Miguel Photo ofA madrugada despontando por detrás da torre da igreja de San Miguel

A madrugada despontando por detrás da torre da igreja de San Miguel

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Sobre o Lima

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Photo ofA saca pendurada na porta da capela à espera do pão (Capilla das Quintás) Photo ofA saca pendurada na porta da capela à espera do pão (Capilla das Quintás) Photo ofA saca pendurada na porta da capela à espera do pão (Capilla das Quintás)

A saca pendurada na porta da capela à espera do pão (Capilla das Quintás)

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Photo ofNa velha ponte sobre o Río Pacín Photo ofNa velha ponte sobre o Río Pacín Photo ofNa velha ponte sobre o Río Pacín

Na velha ponte sobre o Río Pacín

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Photo ofReminiscência de devoções antigas (em O Casal)

Reminiscência de devoções antigas (em O Casal)

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Igrexa de Santa María a Real de Entrimo

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Photo ofSão rosas, senhora, são rosas e... ovelhas. Photo ofSão rosas, senhora, são rosas e... ovelhas. Photo ofSão rosas, senhora, são rosas e... ovelhas.

São rosas, senhora, são rosas e... ovelhas.

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Photo ofA calçada e a Ponte do Folón sobre o rio Agro Photo ofA calçada e a Ponte do Folón sobre o rio Agro Photo ofA calçada e a Ponte do Folón sobre o rio Agro

A calçada e a Ponte do Folón sobre o rio Agro

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Photo ofEntre antigos muros descansava uma cobra ao sol do meio dia. Alguém desatou a fugir. (Granxa, Ladeira do Cernadelo) Photo ofEntre antigos muros descansava uma cobra ao sol do meio dia. Alguém desatou a fugir. (Granxa, Ladeira do Cernadelo)

Entre antigos muros descansava uma cobra ao sol do meio dia. Alguém desatou a fugir. (Granxa, Ladeira do Cernadelo)

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Photo ofChegando a Pereira Photo ofChegando a Pereira Photo ofChegando a Pereira

Chegando a Pereira

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Um companheiro guloso almoçou connosco

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Photo ofCruzeiro junto à Igrexa de S. Facundo Photo ofCruzeiro junto à Igrexa de S. Facundo Photo ofCruzeiro junto à Igrexa de S. Facundo

Cruzeiro junto à Igrexa de S. Facundo

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Photo ofO gado pastando e nós passando Photo ofO gado pastando e nós passando Photo ofO gado pastando e nós passando

O gado pastando e nós passando

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Photo ofDe novo a irregularidade da calçada Photo ofDe novo a irregularidade da calçada Photo ofDe novo a irregularidade da calçada

De novo a irregularidade da calçada

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Photo ofCuriosidade de quem estranha ver-nos passar Photo ofCuriosidade de quem estranha ver-nos passar Photo ofCuriosidade de quem estranha ver-nos passar

Curiosidade de quem estranha ver-nos passar

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Sós na imensidão da serra

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Photo ofObservando os garranos selvagens Photo ofObservando os garranos selvagens

Observando os garranos selvagens

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Photo ofO céu, a serra, nós e os megalitos. Lindo! Photo ofO céu, a serra, nós e os megalitos. Lindo! Photo ofO céu, a serra, nós e os megalitos. Lindo!

O céu, a serra, nós e os megalitos. Lindo!

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Photo ofEntre Galiza e Minho. A fronteira Photo ofEntre Galiza e Minho. A fronteira

Entre Galiza e Minho. A fronteira

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Da Capela do Senhor da Boa Morte da Ameijoeira às ruinas de uma velha habitação

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Photo ofPor caminho cavado na rocha

Por caminho cavado na rocha

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Photo ofPoço do Contador no Rio Castro Laboreiro Photo ofPoço do Contador no Rio Castro Laboreiro Photo ofPoço do Contador no Rio Castro Laboreiro

Poço do Contador no Rio Castro Laboreiro

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Photo ofA pontelha e o moinho d'água de Bago de Baixo (Ribeira da Curveira) Photo ofA pontelha e o moinho d'água de Bago de Baixo (Ribeira da Curveira) Photo ofA pontelha e o moinho d'água de Bago de Baixo (Ribeira da Curveira)

A pontelha e o moinho d'água de Bago de Baixo (Ribeira da Curveira)

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Photo ofA água desliza límpida e serena sob as pedras que ponteiam o rio Laboreiro Photo ofA água desliza límpida e serena sob as pedras que ponteiam o rio Laboreiro Photo ofA água desliza límpida e serena sob as pedras que ponteiam o rio Laboreiro

A água desliza límpida e serena sob as pedras que ponteiam o rio Laboreiro

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Photo ofAs velhas pontes por onde tantos rebanhos passaram (Ribeiro da Dorna) Photo ofAs velhas pontes por onde tantos rebanhos passaram (Ribeiro da Dorna) Photo ofAs velhas pontes por onde tantos rebanhos passaram (Ribeiro da Dorna)

As velhas pontes por onde tantos rebanhos passaram (Ribeiro da Dorna)

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Photo ofPela sombra dos carvalhos Photo ofPela sombra dos carvalhos

Pela sombra dos carvalhos

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Photo ofLageado e árvores caídas enfeitando ou enfeitiçando o caminho

Lageado e árvores caídas enfeitando ou enfeitiçando o caminho

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Photo ofTrilho ancestral na vertente da serra

Trilho ancestral na vertente da serra

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Photo ofA Ponte da Cavada Velha ou Ponte Nova rebatizada para Cava da Velha Photo ofA Ponte da Cavada Velha ou Ponte Nova rebatizada para Cava da Velha Photo ofA Ponte da Cavada Velha ou Ponte Nova rebatizada para Cava da Velha

A Ponte da Cavada Velha ou Ponte Nova rebatizada para Cava da Velha

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Photo ofA Ponte da Assureira Photo ofA Ponte da Assureira Photo ofA Ponte da Assureira

A Ponte da Assureira

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